Na década de 80, assisti ao filme “Easy Rider” que causou em mim uma imensa vontade de também sair por aí sem destino, alguns anos depois, tentei com amigos embarcar para U.S.A, mais como diz Belchior, sou apenas um rapaz latino americano, sem dinheiro no bolso e não tive muita chance de conseguir o visto, mesmo assim, fui com a cara e a coragem, mais com cara de pau do que coragem ! Não tenho nada a perder. Antes de embarcar, comprei um pisante daqueles de matar barata no canto da parede e uma camisa nova social ao melhor estilo “Pablo Escobar”, no bolso dinheiro suficiente pra passagem e prato feito, bateria em SP num pé e voltaria em outro; então embarcamos eu e um amigo, seu irmão já estava lá ! Sabíamos que outros da nossa turma tinham passado pelo mesmo caminho e voltado desiludido com o visto negado; se conseguissemos o visto, ótimo ! Caso contrário, a viagem até SP, já seria em si uma grande aventura. Nosso entusiasmo de juventude, um pingo de esperança e nosso amigo que lá estava, era o que nos movia.
Chegamos na madruga em uma cidade obscura e cinzenta, que nos causou uma cara de poucos amigos, nos falando, sejam bem vindos a selva de pedra seus manés ! E não olhem para trás ! Assim seguimos, com o cú na mão e a passos largos rumo ao nosso destino, olhos e ouvidos bem atentos, pois na calada da noite que atravessávamos nem ladrão se aventurava encarar as ruas e praças suspeitas que nos cercavam, criando em nossa volta um labirinto gigantesco na forma de uma megalópole que nos engolia acada esquina que vencíamos.
Aos poucos o dia foi amanhecendo e com ele uma sensação de proteção falsa, chegamos no consulado e de cara uma fila quilométrica, daquelas de INSS que chega a desanimar só de olhar ! Para quem não queria encarar a fila, existia a possibilidade de comprar seu lugar, alguns oportunistas guardavam lugares na fila, em troca de uma grana.
Observei na fila várias pessoas conversando entre si, contando suas histórias e levantando informações que pudessem ajudar de alguma maneira a conseguir o carimbo na entrevista. Mais o chamado sonho americano, não era tão sonho assim ! Na fila , pessoas de todos os arquétipos, tinha um maluco beleza que levou um disco gravado com sua impressão na capa, daquelas capas memoráveis do Roberto Carlos, era literalmente sua identidade estampada, quase que emprestei meu sapato bico fino pra combinar.
Chegando em seu carrão estilo Herman Monstro o “Cônsul” , imponente com seu chofer puxa-saco ! Como sempre a boteca só começa com o cara e ele como sempre, faz questão de atrasar-se ! Aposto que levanta a hora que bem entende e toma seu brackfast com ovos e baicom fritos, bem diferente do pingadão num bar na mesma rua onde experimentei com um pão de queijo quando chegamos; Recordo-me do barulho de estilhaços quando estava tomando café, estiquei o pescoço pra fora do boteco e observei um carro com o vidro quebrado, tinham roubado o radio de um dos carros estacionados ali na cara do gol, quisera fosse o carro oficial do consulado.
A fila começa andar, mais devagar do que o bondinho na XV de Novembro, lembrava a cena do filme Pink Floyd The Wall, onde crianças estão em suas carteiras escolares sobre uma esteira rumo a um triturador de carne gigantesco; meu amigo passou por mim com cara de desapontado, senti que não tinha rolado, chega minha vez ! Com cara de cachorro pidão como quem olha para um frango no espeto suculento, o americano subalterno fulminando pergunta do passaporte; passo os documentos por uma abertura que me lembra uma toca de camundongo, estávamos isolados cada um em seu mundo, pois entre eu cidadão do terceiro mundo e ele cidadão americano, já estava transparente nossas grandes diferenças, entre nós, um vidro blindado a prova de balas e um equipamento de retorno de som - Pergunta - O quê vai fazer lá ? Vou passear; Quanto tempo ? Uma semana; Pronto ! Foi suficiente para ser rejeitado, argumentei o porque e ele respondeu - Pode falar com o Cônsul; Com vontade de esganar respondo - Não há necessidade. Apanhei meu passaporte, virei as costas e saí desconsolado. Voltando pela fila observei que as pessoas ficavam resignadas por cada uma que não conseguia o visto, ao mesmo tempo existia nelas uma torcida particular quando alguém conseguia.
O ambiente pelo menos á época era constrangedor, você sentia-se desconfortável, era como cagar de porta aberta em uma festa, o lance era escancarado, tribunal de inquisição, sai de lá pensando nas leis da sociedade alternativa do Raul Seixas, mais que diabos é este direito de ir e vir ? O mundo é somente um, não ? Cercado por linhas imaginárias mal tracejadas, fiquei teorizando e só me recuperei quando fechei os olhos no ônibus e dormi.
Ainda era manhã, tudo já tinha encerrado-se, rápido e rasteiro! Caminhamos em direção a Avenida Paulista procurando um prato feito, depois de gastarmos sola, entramos em uma rua estreita, cheio de lanchonetes que serviam almoço, senti-me um estrangeiro nno local, pois o sotaque que imperava era somente de nordestino (povo que admiro), pedimos então um magnífico PF que vinha transbordando de arroz, feijão, bife acebolado, batata-frita, salada, sucão e aquele ovo de Van Gogh ! Digno de um auto-retrato.
Depois de almoçarmos, cansados e com sono, o sono chega forte e o corpo pede arrego por qualquer canto; com o misero dinheiro contado não restava muitas opções, então pensamos na Igreja da praça da Sé, entramos e observamos que embaixo dos bancos tinham crianças dormindo, cada um então pegou um banco e então me pus a refletir por alguns instantes sobre o dia que enfrentamos, até que o sono mais forte venceu, embaralhando meus pensamentos. Depois de algum tempo acordei com as baterias carregadas; pronto para partir, fui para a rodoviária apanhar o ônibus.
Fiquei feliz com o regresso, aos poucos aquela paisagem cinzenta foi se desfazendo, dando lugar a um fim de tarde amarelo com um sol lisérgico reluzente, ao mesmo tempo em que contemplávamos pela janela uma terra irreal, com nossos corações reais e cheio de vida.
Chegamos na madruga em uma cidade obscura e cinzenta, que nos causou uma cara de poucos amigos, nos falando, sejam bem vindos a selva de pedra seus manés ! E não olhem para trás ! Assim seguimos, com o cú na mão e a passos largos rumo ao nosso destino, olhos e ouvidos bem atentos, pois na calada da noite que atravessávamos nem ladrão se aventurava encarar as ruas e praças suspeitas que nos cercavam, criando em nossa volta um labirinto gigantesco na forma de uma megalópole que nos engolia acada esquina que vencíamos.
Aos poucos o dia foi amanhecendo e com ele uma sensação de proteção falsa, chegamos no consulado e de cara uma fila quilométrica, daquelas de INSS que chega a desanimar só de olhar ! Para quem não queria encarar a fila, existia a possibilidade de comprar seu lugar, alguns oportunistas guardavam lugares na fila, em troca de uma grana.
Observei na fila várias pessoas conversando entre si, contando suas histórias e levantando informações que pudessem ajudar de alguma maneira a conseguir o carimbo na entrevista. Mais o chamado sonho americano, não era tão sonho assim ! Na fila , pessoas de todos os arquétipos, tinha um maluco beleza que levou um disco gravado com sua impressão na capa, daquelas capas memoráveis do Roberto Carlos, era literalmente sua identidade estampada, quase que emprestei meu sapato bico fino pra combinar.
Chegando em seu carrão estilo Herman Monstro o “Cônsul” , imponente com seu chofer puxa-saco ! Como sempre a boteca só começa com o cara e ele como sempre, faz questão de atrasar-se ! Aposto que levanta a hora que bem entende e toma seu brackfast com ovos e baicom fritos, bem diferente do pingadão num bar na mesma rua onde experimentei com um pão de queijo quando chegamos; Recordo-me do barulho de estilhaços quando estava tomando café, estiquei o pescoço pra fora do boteco e observei um carro com o vidro quebrado, tinham roubado o radio de um dos carros estacionados ali na cara do gol, quisera fosse o carro oficial do consulado.
A fila começa andar, mais devagar do que o bondinho na XV de Novembro, lembrava a cena do filme Pink Floyd The Wall, onde crianças estão em suas carteiras escolares sobre uma esteira rumo a um triturador de carne gigantesco; meu amigo passou por mim com cara de desapontado, senti que não tinha rolado, chega minha vez ! Com cara de cachorro pidão como quem olha para um frango no espeto suculento, o americano subalterno fulminando pergunta do passaporte; passo os documentos por uma abertura que me lembra uma toca de camundongo, estávamos isolados cada um em seu mundo, pois entre eu cidadão do terceiro mundo e ele cidadão americano, já estava transparente nossas grandes diferenças, entre nós, um vidro blindado a prova de balas e um equipamento de retorno de som - Pergunta - O quê vai fazer lá ? Vou passear; Quanto tempo ? Uma semana; Pronto ! Foi suficiente para ser rejeitado, argumentei o porque e ele respondeu - Pode falar com o Cônsul; Com vontade de esganar respondo - Não há necessidade. Apanhei meu passaporte, virei as costas e saí desconsolado. Voltando pela fila observei que as pessoas ficavam resignadas por cada uma que não conseguia o visto, ao mesmo tempo existia nelas uma torcida particular quando alguém conseguia.
O ambiente pelo menos á época era constrangedor, você sentia-se desconfortável, era como cagar de porta aberta em uma festa, o lance era escancarado, tribunal de inquisição, sai de lá pensando nas leis da sociedade alternativa do Raul Seixas, mais que diabos é este direito de ir e vir ? O mundo é somente um, não ? Cercado por linhas imaginárias mal tracejadas, fiquei teorizando e só me recuperei quando fechei os olhos no ônibus e dormi.
Ainda era manhã, tudo já tinha encerrado-se, rápido e rasteiro! Caminhamos em direção a Avenida Paulista procurando um prato feito, depois de gastarmos sola, entramos em uma rua estreita, cheio de lanchonetes que serviam almoço, senti-me um estrangeiro nno local, pois o sotaque que imperava era somente de nordestino (povo que admiro), pedimos então um magnífico PF que vinha transbordando de arroz, feijão, bife acebolado, batata-frita, salada, sucão e aquele ovo de Van Gogh ! Digno de um auto-retrato.
Depois de almoçarmos, cansados e com sono, o sono chega forte e o corpo pede arrego por qualquer canto; com o misero dinheiro contado não restava muitas opções, então pensamos na Igreja da praça da Sé, entramos e observamos que embaixo dos bancos tinham crianças dormindo, cada um então pegou um banco e então me pus a refletir por alguns instantes sobre o dia que enfrentamos, até que o sono mais forte venceu, embaralhando meus pensamentos. Depois de algum tempo acordei com as baterias carregadas; pronto para partir, fui para a rodoviária apanhar o ônibus.
Fiquei feliz com o regresso, aos poucos aquela paisagem cinzenta foi se desfazendo, dando lugar a um fim de tarde amarelo com um sol lisérgico reluzente, ao mesmo tempo em que contemplávamos pela janela uma terra irreal, com nossos corações reais e cheio de vida.
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